segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

1º Mês

Boas meus amigos,

Faz hoje 1 mês que aterrei em Argel e neste pais...

Curiosamente esta noite regresso a Argel!!! Coincidencias!!!

Um mês afastado de tudo quanto me era familiar até aqui.
Nunca estive tanto tempo a 2000km do mar!!! Aqui mar só de areia e pedra mesmo... Até agora a unica poça de água que vi foi na banheira e o pequeno charco formado pelo esgoto da base de vida de In Guezzam!! Pois é no deserto quase nada existe e uma rede de esgotos então... nunca existirá... No entanto até um esgoto cria vida num local como este. Basta ver os patos em migração, que aterram exaustos, a usá-lo para retemprar forças... a força da vida!!!
Tem sido uma descoberta a cada dia que passa. Uma cultura nova e muito diferente da nossa, ainda que atenuada pela presença dos meus colegas portugueses aqui.

Vou usar alguns excertos de uns e-mails que tenho trocado com uma amiga para ajudar a descrever o que me tem passado pela cabeça, espero que ela não leve a mal:

"...Estive em Argel até ontem na sede da Lena Algerie e vim esta noite para Tamanrasset onde vou fazer a maior parte do meu trabalho. Aqui já é deserto mesmo… vim agora de uma voltinha pela cidade e do posto da policia… isto é mesmo outro mundo, parece que estás num filme. Para já tudo extremamente interessante, esquadra de sonho… só visto… pelas ruas tuaregues a dar com pau… afinal tou na cidade deles…
Argel tem o elemento típico de todas as grandes cidades muçulmanas… suja como tudo … até o cheiro no ar… O acordar aqui em Tamanrasset é lindo … tens grandes montes á tua volta … uma beleza que ainda não consegui interiorizar… afinal acordei à 3 horas."

"...Aqui tens uma cultura e modo de vida completamente diferente do que estamos habituados e é isso que torna este local cativante. É claro que é necessário ter espirito aberto para encarar a coisa desta forma, pois se viermos em busca de semelhanças com o nosso modo de vida habitual vamos ficar extremamente desiludidos. Ao mesmo tempo que digo isto também tenho consciencia que apenas estou cá à 2 dias... e que com o passar do tempo aquilo que me cativa se pode transformar num monte de dificuldades e ser extremamente cansativo..."

"... satisfação vs relativização ... não acho que as referencias tenham de ser colocadas acima do nosso alcance. Para alem disso para mim também está fora de questão baixar o nível de exigência de forma a que nos sintamos melhor… O que eu acho é que nós é que criamos as nossas próprias necessidades, claro que condicionados pelo meio onde estamos inseridos, nisto acho que estamos perfeitamente de acordo. Quando falava em relação ao povo daqui tentava enquadrar justamente este conceito pois esta gente, como não teve acesso a um monte de coisas a que estamos habituados, não tem as mesmas necessidades que nós… ou seja o patamar de exigência/comparação deles está muito abaixo no sentido em que estamos a falar… É claro que dentro dos seus patamares também podem ser extremamente exigentes consigo próprios e muitas vezes até mais radicais que nós… Sem duvida que no equilíbrio estará o caminho a seguir…
De qualquer forma poder observar estas diferenças é extremamente interessante para mim… ainda ontem me deliciei com um empregado de hotel a mostrar-me o que era e como se usava um secador de mãos daqueles que sopram ar quente…lol… ele estava a explicar aquilo como se eu fosse alguém que nunca tinha visto semelhante coisa na vida!!! Um sonho … só visto… claro que o deixei expressar-se e fiz um ar muito admirado!!!
Por outro lado ainda acho que não faz mal algum compararmo-nos com quem tem mais dificuldades do que nós se isso nos fizer dar valor ao que temos… ontem passei por uma menina com uns 2/3 aninhos que andava sozinha toda suja, descalça no meio de uma rua imunda e com um bocado de cartão na mão… sabes que te toca no coração veres miúdos pobres na rua… gente que não tem qualquer tipo de acesso a uma educação digna… ou a condições mínimas de higiene… é muito triste ver miséria… e acredita que te toca, não duvides… a miséria é muito triste… nós não sabemos o que é isso… falta-me dizer-te que a miúda ia com um sorriso lindo nos lábios…"

Isto é um pouco de que me ia pela cabeça nos 1ºs 15 dias de Argélia. Daqui uma coisa levamos com certeza quando partirmos... uma aprendizagem enorme... não há que duvidar.

Nos ultimos 15 dias tenho sentido que as diferenças que saltam mais á vista no inicio começam a tornar-se rotina e deixam de prender tanto a nossa atenção. De alguma forma estou curioso para ver onde isto vai dar... ou seja será que me posso tornar num ser insensivel que não liga ao que observa que à sua volta ... que deixa de se sentir incomodado com as dificuldades desta gente? Não creio...

Ontem passei por uma situação que novamente me tocou fundo... dou por mim com um homem de ~40 anos na cadeira em frente da minha secretária que não se contem e desata chorar compulsivamente... porque? perguntam vocês... está deslocado de casa 2000km e na nossa obra não existe forma de ele comunicar com a familia... está a trabalhar para alimentar a casa, é o unico que ganha pois claro, e estava à 3 semanas sem contactar com a mulher e com filho de 3 anos hospitalizado devido a um acidente de viação. Claro que arranjei forma de resolver a coisa, trouxe o homem comigo até Tam. ~140km ele foi ao banco enviar €€ para casa e telefonar e depois arranjei forma de ele voltar para trabalhar no dia seguinte... Mas digo-vos uma outra coisa... só sei que não fui enganado porque o homem regressou para trabalhar!! E se regressou é porque precisa mesmo!!! Neste momento e por causa das festas que vão iniciar-se até gajos a dizer que têm de ser operados aos "tomates" já tive à minha frente!!! E gajos que largam o emprego também!!! Pronto... pronto... eu digo... o puto já estava muito melhor e à hora de jantar o homem também já sorria!!! Gostei da humildade do homem e pareceu-me realmente sincero... o que é dificil de encontrar por aqui... estes gajos inventam cada filme...

Agora é portanto altura de festa por aqui... Aïd el-Kébir assim se chama e celebra a disponibilidade de Abraão para sacrificar o seu filho por Deus a seu comando.
Á que matar cabras!!! Pelo que sei é um abuso... até em Argel se vê sangue pelas ruas... pelos vistos cada familia mata 2 e depois têm de as comer... como este gajos comem pouco isso leva para aí uma semana.
Já agora, o ano Islamico é baseado em 12 meses lunares o que perfaz 354 ou 355 dias portanto 11 dias a menos que no nosso calendário o que implica que a cada ano que passa a passagem de ano recue 11 dias... pode resultar numa em Janeiro ou Fevereiro... interessante!!! Como as festas são religiosas e com esta confusão de luas em relação ao calendário civil resulta que estas festas, em que pára tudo, só têm datas anunciadas pouco dias antes de acontecerem!!! E meus amigos este país pára!!! Não duvidem.... Problemas!!!

Ou seja,
Para já está a ser uma experiencia muito interessante vamos ser se com o tempo se tornará demasiado cansativa...
A aprendizagem é continua por aqui, principalmente em termos da cultura pois é aí que existem as maiores diferenças... de resto máquinas são máquinas e avarias são avarias...

Até um dia destes!!!
Já agora façam o favor de introduzir uns comentários ás mesagens que deixo... se o blog for interactivo será muito mais interessante.

Beijos e Abraços !!!!!!!!!!